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Sobre o imperialismo – a pirâmide imperialista (parte 3)


De Aleka Papariga, ex-Secretária Geral do CC do Partido Comunista da Grécia (KKE)


Invocação do patriotismo para justificar a estratégia da burguesia de retirar o máximo partido possível da nova distribuição em condições de implacável rivalidade imperialista


Os oportunistas e os partidos nacionalistas na Grécia clamam que a burguesia, o Estado grego e os partidos burgueses não são patriotas, mas traidores. Na realidade, a burguesia do nosso país, assim como os seus partidos, estão bem cientes de que, mesmo em condições de desigualdade, é preferível aderir a uma união imperialista, porque é a única maneira de reivindicar uma parte dos despojos e esperar ter apoio político-militar externo se o sistema começar a tremer e, se a luta de classes se intensificar, impedir e esmagar o movimento com a ajuda dos mecanismos militares da União Europeia e da NATO. O patriotismo da burguesia identifica-se com a defesa do sistema capitalista apodrecido.


Em condições em que as contradições inter-imperialistas e mundiais levem a um conflicto militar, então a burguesia da Grécia terá de escolher o lado de um imperialista poderoso, qual a aliança imperialista que vai lutar pela redistribuição dos mercados na esperança de tomar nem que seja uma pequena parte.


É impossível para a burguesia defender direitos soberanos em nome do povo. Fá-lo-á apenas para os seus próprios interesses. Se necessário, ela até ignorará os seus interesses particulares para não perder o poder, para mantê-lo tanto quanto seja possível.


A teoria de um punhado de países dominantes


Quando Lenine falou de um punhado de países saqueando um grande número de países, ele destacou com muitos exemplos e detalhes uma variedade de formas de pilhagem de países coloniais, semi-coloniais ou mesmo não coloniais. No topo da pirâmide está um pequeno número de países, pois o capital financeiro (uma das cinco características básicas do capitalismo na fase imperialista como a fusão do capital bancário com o capital industrial) está a espalhar os seus tentáculos por todos os países do mundo.


A posição de um “punhado de países” define as diferentes formas de relações entre países capitalistas que se caracterizam pela desigualdade. É o que a pirâmide descreve para ilustrar a economia capitalista mundial.


Em primeiro lugar, Lenine deixou claro que o imperialismo é o capitalismo monopolista, é a economia capitalista mundial, é o prólogo da revolução socialista em todos os países.


Lenine esclareceu as características do imperialismo: a concentração da produção e do capital, a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação da oligarquia financeira, a exportação do capital, a criação de uniões monopolistas internacionais. Não se trata de uma política de anexações, de dependências do ponto de vista moral, ou de um fenómeno que reflicta uma certa visão política no âmbito do sistema político burguês, algo que os oportunistas sistematicamente fazem. Ele liga directamente o imperialismo nas relações internacionais com a ascensão do capital financeiro na fase imperialista do capitalismo e com a sua necessidade imperiosa de expandir continuamente o terreno económico para além das fronteiras nacionais, a fim de retirar de lá os antagonistas. A retirada do antagonista poderia ser feita mais facilmente através da colonização, bem como através da transformação de uma colónia num Estado politicamente independente, retirando do caminho o país capitalista-metrópole, cuja posição seria ocupada por outra potência capitalista emergente através da exportação de capital e investimento estrangeiro directo. A posição diferente da Grã-Bretanha colonialista e da Alemanha emergente como potência imperialista é importante e ilustrativa.


A redivisão do mundo no final do século XIX e início do século XX de que falava Lenine, ocorreu entre os países capitalistas mais poderosos. No entanto, no jogo da repartição, da formação da correlação negativa geral de forças, outros Estados capitalistas também estiveram envolvidos, não permaneceram passivos. Os países capitalistas fortes dividiram não apenas as colónias, mas também os países não coloniais enquanto, além das grandes potências coloniais, havia países coloniais menores através dos quais a nova expansão colonial começou. Há até menções a pequenos Estados que mantiveram colónias quando as grandes potências coloniais não conseguiram chegar a um acordo sobre a repartição.


Além disso, Lenine ressaltou que a política colonial existia mesmo em sociedades pré-capitalistas, mas o que distingue a política colonial capitalista é que ela é baseada no monopólio. Ele sublinhou que a variedade de relações entre os Estados capitalistas no período do imperialismo tornam-se um sistema geral, constituem parte da totalidade das relações de divisão do mundo, tornam-se elos nas cadeias de operações do capital financeiro mundial. No período a que Lenine se refere, e ainda mais hoje, relações de dependência e pilhagem de matérias-primas também existem às custas de não-colónias, ou seja, Estados politicamente independentes.


Após a Segunda Guerra Mundial e o estabelecimento do sistema socialista internacional, o agrupamento máximo do imperialismo contra as forças do socialismo-comunismo foi necessariamente realizado e a sua agressividade, o seu expansionismo económico, político e militar multifacetado intensificaram-se. Sob o impacto da nova correlação de forças, começou rapidamente o desmantelamento dos impérios coloniais, os impérios francês e britânico. Os Estados capitalistas mais poderosos foram forçados a reconhecer a independência dos Estados nacionais, sob a pressão dos movimentos pela independência nacional que contavam com o múltiplo apoio e solidariedade dos países socialistas, dos movimentos operários e comunistas.


No pós-guerra, vários países não foram plenamente incorporados nos órgãos político-militares e económicos do imperialismo, pois tinham a possibilidade de estabelecer relações económicas com os países socialistas, apesar de a correlação de forças permanecer favorável ao capitalismo. Reafirma-se a variedade de relações, interdependências e obrigações no âmbito do mercado capitalista mundial.



Na última década do século XX, a situação começou a mudar como resultado de dois factores interagindo entre si, mas cada um com a sua autonomia relativa. Os países capitalistas mais maduros e poderosos, que estão no topo da pirâmide, com um ponto de partida histórico diferente, mas com o mesmo objetivo estratégico, seguem uma política diferente em favor dos monopólios, especialmente sob o impacto da crise económica capitalista de 1973. Em condições de crescente concorrência e de internacionalização mais rápida, a estratégia contemporânea que sustenta a rentabilidade capitalista abandona as receitas neokeynesianas que foram úteis sobretudo em países que sofreram danos bélicos. Procedeu a amplas privatizações, fortaleceu a exportação de capital, reduziu e aboliu gradualmente as concessões que fizera principalmente no sector social, com o objectivo de deter o movimento operário influenciado pelas conquistas do socialismo e, especialmente, comprar uma parte da classe trabalhadora e dos sectores sociais intermédios.


Isso também é demonstrado pelo facto de a política pró-imperialista contemporânea ter um carácter mundial; não é uma forma de gestão a curto prazo, mas uma escolha estratégica, dado que estão a ser adoptadas medidas anti-populares e anti-laborais para contrariar a tendência decrescente da taxa de lucro em quase todos os países, não só na União Europeia, mas também fora dela, especialmente na América Latina. As medidas destinadas a eliminar as conquistas laborais são tomadas por governos liberais e social-democratas, tanto de centro-esquerda como de centro-direita.


A restauração capitalista deu ao imperialismo a oportunidade de lançar uma nova onda de ataques com menos resistência, auxiliada pelo oportunismo que se tinha fortalecido, enquanto novos mercados se formavam nos antigos países socialistas. Como resultado, a unidade entre as principais potências contra o socialismo, que colocava as contradições entre elas em segundo plano, foi enfraquecida. Uma nova rodada de contradições inter-imperialistas irrompeu sobre a divisão de novos mercados, levando a guerras nos Balcãs, na Ásia, no Médio Oriente e no Norte da África. Estados que não faziam parte das uniões inter-estatais imperialistas também participaram nessa guerra. Isso mostra que o sistema imperialista existe como um sistema mundial. Isto inclui todos os países capitalistas, mesmo aqueles que são atrasados ou têm restos de formas pré-capitalistas de economia. As principais potências estão no topo; existe uma forte concorrência entre elas e os acordos alcançados são temporários.


No final do século XX, havia três centros imperialistas desenvolvidos principalmente após a Guerra Mundial: a Comunidade Económica Europeia, que mais tarde se tornou a União Europeia, os EUA e o Japão. Hoje, os centros imperialistas aumentaram e novas formas de alianças surgiram, como a aliança que tem a Rússia no seu núcleo, a aliança de Xangai, a aliança do Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul (BRICS), a aliança dos países da América Latina (Mercosul, ALBA) etc.


A política imperialista é exercida não apenas pelos países capitalistas do topo, mas também por aqueles que estão noutros níveis, mesmo aqueles que são fortemente dependentes das grandes potências, como as potências regionais e locais. Hoje, na nossa região, como é o caso da Turquia, de Israel, dos Estados árabes e, as potências através das quais o capital monopolista ocupa novos terrenos, também se encontram na África, na Ásia, na América Latina e, como consequência, temos o fenómeno da dependência e da interdependência.


A dependência e a interdependência das economias, é claro, não são iguais. Elas são determinadas pela força económica de cada país, bem como por alguns outros elementos militares e políticos, dependendo dos laços particulares da aliança.


Embora um ou mais países estejam no mais alto nível e sejam os líderes da internacionalização e distribuição capitalistas, eles ainda estão sob um regime de interdependência com outros países. Por exemplo, na Europa, a Alemanha pode ser a principal potência, mas as exportações de bens de capital e industriais dependem da capacidade dos Estados europeus de absorvê-los. Já na China, devido à crise, essa possibilidade começou a ser limitada e é por isso que os círculos dirigentes do governo, bem como sectores da burguesia, especialmente na indústria, reflectem e se preocupam.


O curso da economia dos EUA depende em grande parte da China, bem como de interesses opostos na União Europeia; a batalha do dólar, do euro e do iene é visível.


Nas Teses do 19º Congresso, destaca-se que a tendência de mudança na correlação de forças entre os Estados capitalistas também se reflecte na participação dos países no fluxo de capitais na forma de Investimento Estrangeiro Direto (IED), bem como nas reservas de capital na forma de IED que têm fluído.


O número de Estados satélites de fortes potências imperialistas, países capitalistas regionais que desempenham um papel particular na política de alianças e filiação numa ou noutra potência da pirâmide, está a aumentar. As contradições inter-imperialistas vigoram em todas as formas de aliança e todas essas relações multifacetadas, que abrangem todos os países capitalistas do mundo, sem excepção, constituem a pirâmide imperialista.


A nossa referência a isto não significa, de modo algum, que concordemos com as posições sobre o “ultra-imperialismo”, de que somos injustamente acusados. Muito pelo contrário! Ressaltamos sempre que, no sistema imperialista, que representamos sob a forma de pirâmide, fortes contradições continuam a desenvolver-se e a manifestar-se entre os Estados imperialistas, os monopólios, pelo controle de matérias-primas, rotas de transporte, participações de mercado, etc. A burguesia pode formar uma frente comum para a exploração mais eficiente dos trabalhadores, mas sempre afiará as suas facas quando se trata de partilhar os despojos imperialistas.


Além disso, a acusação de que a referência a uma “pirâmide” é uma abordagem “estruturalista” do imperialismo é ridícula. Lenine, como se sabe, usou o esquema da “cadeia”. O esquema que é usado em cada ocasião é uma forma de ajudar os trabalhadores a entender a realidade do imperialismo como capitalismo monopolista, como capitalismo podre e moribundo, no qual todos os países capitalistas estão incorporados, de acordo com a sua força (económica, política, militar, etc.). Isso está claramente em conflicto com a chamada “abordagem cultural” do imperialismo que, como fez Kautsky, separa a política do imperialismo da sua economia. Lenine apontou que essa abordagem nos levaria à avaliação errónea de que os monopólios na economia podem coexistir, na política, com um tipo de actividade não monopolista, não violenta e não predatória.



O desenvolvimento desigual é ainda mais evidente não apenas entre os países capitalistas poderosos em comparação com os mais fracos, mas também no núcleo duro dos países mais poderosos. Note-se que, na Europa, o fosso entre a Alemanha, por um lado, e a França e a Itália, por outro, está a aumentar. No entanto, o fenómeno mais importante e característico é o declínio da parte dos EUA, da UE e do Japão no Produto Mundial Bruto. A zona euro já não ocupa o segundo lugar; caiu para o terceiro lugar, enquanto a segunda posição foi ocupada pela China. A participação da China e da Índia no produto bruto mundial aumentou, enquanto a participação do Brasil, Rússia e África do Sul permanece estável.


No que diz respeito ao capital que constitui o abastecimento do IED [Investimento Estrangeiro Direto], há uma notável tendência de fortalecimento do capital das economias emergentes do grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul). A China reforça-se como destino de IED após a eclosão da crise capitalista em 2008. Como exportadora de capital, está a aumentar a sua participação no IED externo global, que mais do que duplicou em 2007-2009 e permaneceu num nível elevado desde então.


Por outro lado, a participação das economias capitalistas desenvolvidas na entrada e saída de capital de IED tende a diminuir após a eclosão da crise. É claro que eles não perdem a sua primazia (mantendo distância do grupo anterior de países), já que no meio das crises a maior parte se dirige ou provém dos EUA e dos países da União Europeia.


Uma tendência semelhante está a desenvolver-se no que diz respeito à participação das importações e exportações de mercadorias. A participação da China está a reforçar-se constantemente em relação ao total das exportações de mercadorias, bem como no conjunto às importações. A correspondente participação da Índia está a fortalecer-se, mas a um ritmo muito mais lento, enquanto a Rússia, a Coreia do Sul e a África do Sul estão a mover-se num ritmo cada vez maior.


Os únicos países membros da OCDE que superam os EUA em produtividade (volume de produção por unidade de tempo) são a Noruega, a Irlanda, o Luxemburgo e, logo atrás, a Alemanha, a França, a Bélgica e a Holanda.


Nas Teses do 19º Congresso é enfatizado que mudanças na correlação de forças entre os Estados capitalistas aumentam a possibilidade de uma mudança geral na posição da Alemanha em relação à questão das relações euro-atlânticas e ao reordenamento dos eixos imperialistas. Os factores decisivos para esta evolução são, por um lado, as relações de interdependência entre as economias dos Estados Unidos e da União Europeia e, por outro, o antagonismo entre o euro e o dólar como moedas de reserva internacional e o reforço da cooperação entre a Rússia e a China.


Fonte: Iskra - Associação de Estudos Marxistas-Leninistas e El Machete (El Comunista)

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