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A KO entrevista o Movimento Alavanca sobre o PREC - parte 2


Entrevista da KO ao Alavanca:

KO - Como vocês avaliam o perigo que a vitória sobre o fascismo em Portugal representou para o  imperialismo na Europa e no mundo? Como os países líderes do imperialismo lidaram com a  situação?


Alavanca - A vitória sobre o fascismo em Portugal deu-se num processo muito rápido de agudização das contradições de classe e de ascenso da luta de classes que colocou a luta pelo poder entre capitalismo e socialismo, num contexto muito favorável ao socialismo e à revolução socialista. Espanha e Grécia estavam numa situação semelhante a Portugal com regimes fascistas desgastados e prestes a ser derrubados mas o Partido Comunista de Espanha (PCE) estava já bastante degrado pelo "euro-comunismo" e o Partido Comunista da Grécia (KKE) ainda não tinha superado o seu etapismo. O impacto do PREC foi importante sobretudo em Espanha mas se tivesse havido pelo menos tentativa de tomada do poder por uma revolução socialista liderada pelo PCP e UDP seria muito provável um impacto muito mais forte no PCE e no KKE e na possibilidade de ascenso revolucionário também em Espanha e na Grécia.  Como não houve tentativa do PCP tomar o poder em Portugal o impacto fora de Portugal foi mais limitado mas mesmo assim achamos que podemos atribuir ao PREC uma certa influência na reorganização do partido comunista revolucionário em Espanha com as cisões muito significativas do PCE nos anos 80 que deram lugar ao PCPE que hoje se chama PCTE (e é um partido que nós admiramos e apoiamos como um partido irmão e é em muitos aspectos um exemplo a seguir). Em relação à reacção das potências imperialistas face aos acontecimentos do PREC, existiu uma grande intervenção (embora sempre encoberta para evitar reacções anti-imperialistas das massas portuguesas) da parte dos Estados Unidos e da Alemanha, o que certamente incluiu sobretudo muito financiamento para tentar corromper o movimento operário e popular formando a aristocracia operária pela compra de sindicalistas e dirigentes de organizações de massas. São conhecidas as intervenções de Frank Carlucci, embaixador dos EUA na época, ao reunir com Mário Soares, líder do PS e principal líder das forças burguesas e contra-revolucionárias. Houve certamente também a entrega de armas por parte das potências imperialistas a forças reaccionárias e a grupos terroristas fascistas que tentaram fazer recuar as forças revolucionárias com atentados bombistas e ataques às sedes das forças revolucionárias. A intervenção das forças imperialistas por meios armados foi no entanto limitada pelo facto de que uma intervenção forte só iria empurrar o exército e o MFA ainda mais para o lado da revolução socialista. Mas não faltou dinheiro das forças imperialistas para comprar consciências entre a pequeno-burguesia e a aristocracia operária, assim se fundou a central sindical profundamente reaccionária do PS e do PSD, a UGT.


KO - A orientação estratégica predominante no movimento comunista internacional desde a Segunda  Guerra Mundial é conhecida como "estratégia de frente popular". Criticamos essa ideia porque  ela é orientada para uma aliança com forças oportunistas e abertamente burguesas com o objetivo de derrotar um "mal maior", como o fascismo. Ela está ligada à ideia de, por exemplo, um  "estágio" antifascista que ocorre antes da luta para derrubar toda a burguesia. Qual foi a  estratégia do PCP antes, durante e depois do 25 de Abril? Ela correspondeu a uma "estratégia de  frente popular", tal como foi delineada acima? Houve alguma mudança na estratégia durante o  próprio PREC? Como avaliam essa estratégia em geral, que erros foram cometidos?


Alavanca - Nós também criticamos a "estratégia de frente popular" que se tornou obsoleta depois da Segunda Guerra Mundial. A Frente Popular, apesar de já conter muito erros e aplicações erradas na época em que foi feita como linha política táctica internacional para todos os partidos da Internacional Comunista, não foi feita apenas como meio de derrubar ou evitar regimes fascistas mas acima de tudo foi feita para defender a União Soviética de uma guerra que a tentou invadir e subjugar (uma guerra lançada pelos regimes fascistas da Alemanha e da Itália). A partir do fim da Segunda Guerra Mundial a Frente Popular degenerou de táctica com alguns problemas para estratégia revisionista - principalmente utilizada pela corrente "euro-comunista" mas que influenciou todo o movimento comunista internacional. 


Ainda que seja correcta a crítica de aplicações e erros da linha da Frente Popular até 1945 e ainda mais a sua rejeição como ferramenta revisionista após 1945, isso não significa que a crítica de Trotsky e do trotskismo e a crítica de Francisco Martins Rodriques (no seu livro "Anti-Dimitrov") e a dos seus seguidores à mesma Frente Popular esteja correcta. Nós, Alavanca, subscrevemos actualmente principalmente as críticas à linha da Frente Popular do KKE, PCM e PCTE e vemos também de forma positiva as críticas da KO. Existem várias críticas pela esquerda à Frente Popular e podemos até dizer que existe uma certa generalidade mais ou menos comum a todas elas em afirmações como "os partidos comunistas colocaram-se a reboque da social-democracia e de outras forças burguesas". Mas ver apenas este aspecto da crítica às Frentes Populares, que é quase consensual numa crítica pela esquerda, é não ver coisa nenhuma. Para além de aspectos evidentes desta política de alianças as críticas pela esquerda enveredaram ou pela defesa da experiência de construção do socialismo na URSS e pela defesa do partido comunista como partido de vanguarda ou pela rejeição de todas as experiências de construção do socialismo no século XX e pela rejeição do partido leninista. Não podemos desligar as críticas à Frente Popular do conteúdo mais amplo da linha política das forças políticas que o fazem, porque num sentido revolucionário ou oportunista as Frentes Populares foram criticadas de várias maneiras, e dependendo desse ponto de vista esta crítica foi usada ou para construir ou para liquidar o movimento comunista internacional revolucionário que nós defendemos. É verdade que essencialmente a política das forças revolucionárias durante o PREC é uma variante das Frentes Populares, nomeadamente o programa da Revolução Democrática e Nacional do PCP e o programa da Revolução Democrática Popular do PCP(R) e UDP. As implicações da estratégia das forças revolucionárias durante o PREC terem sido de tipo Frente Popular foram basicamente: a política de alianças classificou a social-democracia e outras forças burguesas como aliadas dentro do "campo democrático" (apesar destas forças estarem em contradição total com partes essenciais do programa das forças revolucionárias) e a insistência em imaginar uma etapa inexistente entre sociedade-Estado capitalista e sociedade-Estado socialista.

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